terça-feira, 13 de outubro de 2009

Spurgeon e Seu Pensamento sobre Israel e a Igreja

Embora o príncipe dos pregadores tenha afirmado que era um calvinista, porque acreditava que João Calvino fora coerente com as doutrinas bíblicas, Ele, no entanto, não seguia tudo aquilo que o grande reformador e a maioria dos calvinistas históricos acreditavam, isto é, no que tange a Escatologia. Isto fica evidente, através de uma leitura nos escritos e nos sermões de Spurgeon, os quais demonstram claramente que ele era um pré-milenista histórico. O herdeiro dos puritanos, diferente daqueles (os puritanos), acreditava que o Senhor Jesus Cristo inaugurará a era do milênio com o Seu advento, o qual também reinará pessoalmente com os Seus santos sobre a terra durante aquele período. Acreditava também que haverá ressurreição, tanto de justos como de injustos, porém, não simultaneamente, mas sim, separadas, primeiro a dos justos, antes do milênio e depois a dos injustos, após os mil anos.[1]

Na história da Igreja pode-se perceber que os maiores teólogos da igreja, tais como: Agostinho, Lutero e Calvino, não eram pré-milenistas, e sim, amilenistas. Santo Agostinho, de quem Spurgeon acreditava ter Calvino aprendido as doutrinas bíblicas, é comumente aceito como aquele que silenciou o pré-milenismo e passou a defender uma interpretação amilenista do capítulo 20 de Apocalipse, ou seja, interpretou os mil anos como a era da Igreja.[2] O próprio Calvino foi completamente contra qualquer conceito de um reino terreno de Cristo de mil anos literais:



Mas um pouco adiante seguiam os chiliasts, que limitavam o reino de Cristo a mil anos. Agora sua ficção é ingênua demais para necessitar ou valer a pena uma refutação. E o Apocalipse, do qual eles indubitavelmente tiraram um pretexto para seu erro, não os apóia, pois o número “mil” não se aplica à bem-aventurança eterna da igreja, mas somente às várias turbações que esperavam a igreja, enquanto ainda trabalhando na terra. Pelo contrário, as Escrituras proclamam que não haverá fim nem para a felicidade do eleito, nem para a punição do ímpio (Mt. 25:41, 46).[3]


Esta visão está implícita nos credos históricos primitivos do Cristianismo. Ela foi sustentada pelos maiores teólogos da Igreja. Teólogos Reformados mais recentes também têm esposado esta visão: Abraham Kuyper, H. Bavinck, Louis Berkhof, Anthony A. Hoekema, Jay E. Adams, William Hendricksen dentre outros.[4] Além do mais, esta é a posição das Confissões Reformadas.


Porém, é bom ressaltar que Spurgeon, como pré-milenista histórico que era, não entendia uma separação entre Israel e igreja, como os pré-milenistas modernos vêem hoje. Isto fica bem claro em um de seus sermões pregados em Hebreus 13:8, cujo título é Jesus Christ Immutable (Jesus Cristo Imutável). Veja o que ele diz:


Distinções foram feitas por certos homens excessivamente sábios (medidos pela estimativa de si mesmos), entre o povo de Deus que viveu antes da vinda de Cristo, e aqueles que viveram posteriormente. Temos até ouvido afirmações de que aqueles que viveram antes da vinda de Cristo, não pertencem à igreja de Deus! Nós nunca sabemos o que vamos ouvir depois, e talvez seja uma mercê que estas absurdidades são reveladas de cada vez, a fim de que sejamos capazes de aturar a sua estupidez sem morrer de admiração. Cada filho de Deus em todo lugar está no mesmo patamar; o Senhor não tem alguns filhos que ama mais, alguns que são da geração de segundo grau, e outros que Ele dificilmente cuida. Estes que viram o dia de Cristo antes que o mesmo chegasse, tinham uma grande diferença quanto àquilo que eles sabiam, e talvez na mesma medida uma diferença quanto àquilo que desfrutavam enquanto na terra em sua meditação sobre Cristo; mas eles todos foram lavados no mesmo sangue, todos redimidos com o mesmo preço de resgate, e feitos membros do mesmo corpo. Israel no pacto da graça não é o Israel natural, mas todos os crentes de todas as eras. [5]




[1] C.H. Spurgeon, The Saint & His Savior, p. 154. V. tb. C. H. Spurgeon, The Metropolitan Tabernacle Pulpit, vol. 10, p. 350; vol. 11, p. 307; vol. 36, p. 317; vol. 39, p. 169; vol. 50, p. 169; vol. 56, p. 39; C. H. Spurgeon, The Treasury Of David, vol. 3, p. 903.


[2] Martyn Lloyd-Jones. Grandes Doutrinas Bíblicas, p. 248. A passagem chave sobre o Milênio defendida por Santo Agostinho, pode ser encontrada em: AGOSTINHO, The City of God. In: Schaff (ed). Augustine: City of God, Christian Doctrine [Agostinho: A cidade de Deus, A doutrina cristã]. The Nicene and Post-Nicene Fathers, vol. 2. Book 20, chapters 6-10.


[3] John Calvin. Institutes of the Christian Religion, vol. 3, cap. 25, p. 488.


[4] R. C. Sproul. Os Últimos dias Segundo Jesus, p. 163.


[5] C.H. Spurgeon, The Metropolitan Tabernacle Pulpit, vol. 15, p. 11.

Postado por Elias Lima