quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Lutero e a Escravidão da Vontade - Parte III


II. Lutero mostra o que Erasmo ensinava


Pela definição de Erasmo sobre o livre-arbítrio, Lutero mostra a ele que sua definição não é clara e que Erasmo precisava explicar tal definição para que a mesma se tornasse clara, pois Erasmo definiu o “livre-arbítrio” da seguinte forma: “Compreendo o Livre-arbítrio como o poder da vontade humana mediante o qual uma pessoa pode aplicar ou afastar-se das coisas que conduzem à eterna salvação” Com base nesta definição, Lutero mostra que o que Erasmo esta fazendo é o mesmo que os pelagianos fizeram. Só que Erasmo ultrapassou o conceito que os pelagianos tinham do livre-arbítrio, pois os pelagianos distinguiam em duas partes o “livre-arbítrio” – o poder de compreender a diferença entre as coisas e o poder de escolher entre elas. Com sua definição, Erasmo estava criando um meio livre-arbítrio, pois o seu “livre-arbítrio” teria o poder de escolher coisas eternas, embora seja totalmente incapaz de entende-las.

Mais adiante Lutero explica a má interpretação que Erasmo fez de Mateus 23:37 dizendo; “ agora chegamos aos seus textos “comprobatórios” do Novo Testamento. Você salienta o trecho de Mateus 23.37: “Jerusalém! Jerusalém! ... quantas vezes quis eu reunir os teus filhos, como a galinha ajunta os seus pintinhos debaixo das asas, e vós não o quisestes!” Você argumenta que, se tudo acontece precisamente conforme Deus deseja, então Jerusalém poderia replicar com justa causa: “Por que desperdiças as tuas lágrimas? Se não tinhas a intenção que déssemos ouvidos aos profetas, então por que os enviaste? Por que nos consideras responsáveis, quando Tu decidiste aquilo que deveríamos fazer ? ” Porém, conforme eu já disse, a nós não compete nos intrometermos na vontade secreta de Deus, pois as coisas secretas de Deus estão inteiramente fora do nosso alcance (1 Tm 6.16). Deveríamos dedicar o nosso tempo considerando o Deus encarnado, o Senhor Jesus Cristo, em quem Deus tornou claro para nós o que deveríamos e o que não deveríamos saber (Cl 2.3). É verdade que o Deus que se tornou carne exclamou: “...quantas vezes quis eu... e vos não o quisestes!” Cristo veio a este mundo a fim de realizar, sofrer e oferecer a todos os homens tudo quanto é necessário a sua salvação. Mas alguns homens, endurecidos por causa da vontade secreta do Senhor, rejeitam-NO (Jo 1.5,11). O mesmo Deus encarnado, entretanto, chora e lamenta-se em face da destruição eterna dos ímpios, ainda que, em sua divina vontade, propositalmente Ele os tenha deixado perecer. Não nos cabe perguntar porquê, mas antes, nos prostrarmos admirados diante de Deus. Neste instante alguns dirão que logo que sou empurrado para um canto, evito enfrentar frontalmente a questão, dizendo que não devemos nos intrometer na vontade secreta de Deus. Entretanto, isso não é invenção minha. Foi dessa maneira que Paulo argumentou em Romanos 9.19,21; e Isaias, antes de Paulo (Is 58.2). E evidente que não devemos procurar sondar a vontade secreta de Deus, sobretudo quando observamos que são justamente os ímpios que são fortemente tentados a fazê-Lo. Nos devemos adverti-los a ficar calados e reverentes. Se alguém quiser levar avante essa forma de inquirição, é bem-vindo a faze-lo; porém, descobrir-se-á lutando contra Deus.

III. Lutero mostra o que ele pensava acerca dos ensinos de Erasmo


Lutero acreditava que Erasmo procurava infundir medo em seus oponentes, reunindo um grande número de textos bíblicos que supostamente davam apoio à idéia do “livre-arbítrio”. Mas os mesmos não passavam de uma manipulação do texto, ou seja, Erasmo torcia os textos para dizerem aquilo que ele acreditava, não aquilo que realmente o texto dizia. Lutero afirmava que Erasmo criara uma nova maneira de perder de vista o significado óbvio de um texto. Na ânsia de defender o “livre-arbítrio”, Lutero diz que Erasmo acabava dizendo toda sorte de coisas contraditórias, especialmente sobre a presciência de Deus. Como por exemplo, na explicação de Romanos 9:15-33, a estava atormentando terrivelmente a mente de Erasmo. Lutero, então, passa a esclarecer-lo dando-lhe um exemplo: “ Deus sabia de antemão que Judas Iscariotes haveria de ser um traidor, por conseguinte, Judas tinha de ser um traidor. Judas não tinha capacidade de agir de outro modo. Obviamente, Judas agiu espontânea e livremente, em harmonia com sua própria natureza. Deus sabia de antemão que Judas estava predisposto a agir e trouxe a ação dele a cena, no momento determinado. Em nada lhe ajuda falar sobre a chamada presciência humana, porquanto ela fica muito aquém da presciência perfeita de Deus. Sabemos, por exemplo, quando um eclipse acontecerá. Mas tal eclipse não acontece porque o previramos. Porém, quando Deus prevê alguma coisa, ela acontece porque Ele assim previra. Se você não aceita isso, mina todas as ameaças e promessas de Deus. Você nega o próprio Deus. Em dado momento, você teve o bom senso de admitir que Paulo ensina que Deus quer aquilo que prevê, e que aquilo obrigatoriamente acontece. Mas então, você estraga tudo, dizendo que acha isso difícil de aceitar. Assim, tenta escapar dessa conclusão, afirmando que Paulo não explicou o ponto, mas somente repreendeu quem estava argumentando com ele (Rm 9.20). Não é essa a forma de manusear os textos sagrados. Um exame do texto mostrará que Paulo explica a questão. De fato, não teria havido razão alguma para a reprimenda, se näo houvesse pessoas argurnentando contra a sua explanação. Paulo cita Êxodo 33.19: ‘Farei passar toda a minha bondade diante de ti, e te proclamarei o nome do SENHOR; terei misericórdia de quem eu tiver misericórdia e me compadecerei de quem eu me compadecer’. Em Seguida, o apóstolo explica que os atos divinos de misericórdia ou de endurecimento não dependem, em coisa alguma, da vontade do homem, mas, exclusivamente, do próprio Deus. Paulo deixou claro que a presciência de Deus determina as ações realizadas pelos homens. Naturalmente, se tentarmos provar tanto a presciência de Deus como o “livre-arbítrio” humano, ao mesmo tempo, teremos problemas — como tentar demonstrar que certo algarismo é, ao mesmo tempo, um nove e um dez! A repreensão de Paulo é para aqueles que se ofendem com a palavra clara que ninguém é possuidor de “Livre-arbítrio”, e de que todas as coisas dependem exclusivamente da vontade de Deus. É este o momento para adorar a majestade do Senhor, em Sua imponência e notáveis julgamentos e dizer: “...faça-se a tua vontade, assim na terra como no céu” (Mt 6:10)

Lutero dizia ainda que Erasmo se utilizava de um bom número de ilustrações que descreviam a cooperação do homem com as operações divinas. Por exemplo: “o agricultor faz a colheita, mas é Deus que a dá”. É obvio, dizia Lutero, que tenho plena consciência da cooperação do homem com Deus, mas isso nada prova a respeito do ‘livre-arbítrio”. Deus é onipotente. Ele exerce total controle sobre tudo quanto Ele mesmo criou. E isso inclui os ímpios, os quais, a semelhança daqueles a quem Deus justificou e transportou para o seu reino, cooperam com Deus neste mundo. Todos os homens precisam seguir e obedecer aquilo que Deus intenciona que eles façam. O homem em nada contribuiu para a sua própria criação. E, uma vez criado, o homem não faz qualquer contribuição para permanecer dentro da criação de Deus. Tanto a sua criação como a sua continua existência são inteira responsabilidade do soberano poder e bondade de Deus, que nos criou e preserva sem qualquer ajuda nossa.

Antes de ser renovado, para fazer parte da nova criação do reino do Espírito, o homem em nada contribui para preparar-se para essa nova criação e reino. Por semelhante modo, quando ele é recriado, em coisa alguma contribui para ser conservado nesse reino. Somente o Espírito de Deus tanto nos regenera quanto nos preserva, sem qualquer ajuda de nossa parte. E como Tiago diz: “Pois, segundo o seu querer, ele nos gerou pela palavra da verdade, para que fôssemos como que primícias das suas criaturas” (Tg 1.18). Tiago está falando a respeito da nova criação. Não obstante, Deus não nos regenera sem que tenhamos consciência do que está sucedendo, porque Ele nos recria e preserva precisamente com esse propósito: que venhamos a cooperar com Ele.E o que e atribuído ao “livre-arbítrio” em tudo isso? Que resta para o “livre-arbítrio” ? Nada! Absolutamente nada!


Postado por Elias Lima

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